Devedor não deve estar sujeito a prisão civil

TJMT

Em que pese haver o descumprimento de suas obrigações, não é cabível determinar a prisão civil de um devedor em razão do não pagamento dos valores contratuais ou caso ele resista em devolver o bem objeto de alienação fiduciária, conforme estabelece o pacto internacional de São José da Costa Rica, firmado em 1988. Seguindo esse entendimento, a Segunda Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Mato Grosso negou acolhimento à Apelação nº 49764/2009, interposta por uma empresa de crédito e financiamento como tentativa de garantir o recebimento do valor relativo ao financiamento de um veículo cujas parcelas estavam atrasadas. Por meio do recurso, a financiadora pleiteou a busca e apreensão do bem ou a prisão civil do devedor, com base no Decreto-Lei nº 911/1969.

De acordo com esse dispositivo, quando a ação de busca e apreensão é convertida em depósito, se o bem não for encontrado, há a possibilidade da prisão do devedor-fiduciante. No entendimento do relator, desembargador Antônio Bitar Filho, essa regra não se aplica ao caso, uma vez que a finalidade do depósito é a guarda da coisa para restituição, o que não ocorre no contrato de alienação fiduciária, pois possui outra característica, qual seja, a de garantir a quitação do débito. Assim, o alienante ou o devedor torna-se possuidor direto e depositário com as responsabilidades e encargos previstos nas leis civil e penal.

Conforme os autos, a empresa ajuizou ação de busca e apreensão em desfavor do apelado, que obteve crédito de R$ 10 mil para adquirir um veículo usado, proveniente de cédula de crédito bancário a ser paga em 36 prestações, sendo a primeira vencida em 12/5/2006 e a última a vencer no dia 12/4/2009. O comprador deixou de pagar as prestações a partir de julho de 2007 e transferiu à financiadora, em alienação fiduciária, o referido veículo. No entanto, o mesmo não foi encontrado pelo oficial de justiça ao tentar cumprir a medida. Diante disso, a empresa solicitou judicialmente a conversão da ordem de busca e apreensão para uma ação de depósito, de forma a exigir que o devedor quitasse financeiramente o valor restante diante da impossibilidade de apreender o carro. O pleito foi atendido. Por outro lado, o relator ressaltou que o contrato de alienação fiduciária em garantia não pode ser comparado com o contrato de depósito a que se refere o Código Civil (artigo 627 e seguintes) porque, neste, uma pessoa recebe um bem alheio com a obrigação de guardá-lo e restituí-lo quando exigido e, naquele, o bem se transforma em mera garantia do contrato.

Quanto ao pedido de prisão, o desembargador detalhou que a nova ordem constitucional implantada em 1988, por ocasião do Pacto de São José da Costa Rica, reforçada pelo entendimento mais recente da jurisprudência majoritária, conclui que ninguém poderá ser preso apenas por descumprir uma obrigação contratual. “É certo que as obrigações sejam cumpridas e existam meios eficazes para sancionar o inadimplente, mas não serve ao interesse público nem se conforma com a Constituição Federal ficar a liberdade das pessoas dependentes do pagamento de empréstimos bancários”, completou o relator. Acompanharam o seu posicionamento a desembargadora Maria Helena Gargaglione Póvoas (vogal) e a juíza substituta de Segundo Grau Marilsen Andrade Addario (revisora convocada).

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