La mère - A mãe por Michel Leiris




Lendo O Segundo Sexo, de Simone de Beauvoir, achei esse trecho escrito de forma crítica que transcrevo aqui:

"...Auguste Comte faz da mulher a divindade da futura Humanidade. Mas é por isso também que todos os revoltados obstinam-se contra a figura da mãe; achincalhando-a, recusam o dado que lhe pretendem impor através da guardiã dos costumes e das leis. 

O respeito de que se aureola a Mãe, as proibições que a cerca reprimem o nojo hostil que se mistura à ternura carnal que inspira. (..) o horror à maternidade sobrevive. Na França, desde a idade Média, criou-se um mito secundário que permite a livre expressão dessas repugnâncias: o da Sogra." 

Cumpriria citar aqui o poema de Michel Leiris, intitulado La mère. Eis alguns trechos característicos:

 "A mãe de preto, roxo, violeta - ladra das noite - é a feiticieria cuja indústria secreta vos põe no mundo, vos embala, vos acarinha, vos deita no esquife, quando não abandona - último brinquedo - a vossas mãos, que colocam gentilmente no ataúde, o corpo encarquilhado(...)

" A mãe - estátua cega, fatalidade erguida no centro do santuário inviolado - é a natureza que vos acaricia, o vento que nos incensa, o mundo que por inteiro vos penetra, vos eleva ao céu (transportado sobre mútiplas espiras) e vos apodrece(...)

"A mãe - jovem ou velha, bela ou feia, misericordiosa ou obstinada - é a natureza que vos acaricia, é a caricatura, o ciumento monstro mulher, o Protótipo decaído - se é que a Idéia (pítia fanada, encarapitada no tripé de sua austera maiúscula) não é senão a paródia dos pensamentos vivos, leves, furta-cores...

"A mãe - de anca avantajada ou seca, de seio flácido ou duro - é o declínio destinado, desde a origem, a toda mulher, o esfarelamento progressivo da rocha faiscante sob o fluxo dos mênstruos, o lento sepultamento - na areia do deserto idoso - da caravana luxuriante e carregada de beleza.

"A mãe - anjo da morte que espia, do universo que enlaça, do amor que a vaga do tempo rejeita - é a concha de insenato desenho (sinal de veneno certo) a ser jogada nos tanques profudos, geradora de círculos para as águas esquecidas.

"A mãe - poça sombria, eternamente enlutada de tudo e de nós mesmos - é a pestilência vaporosa que se irisa e estura, inchando bolha por bolha sua grande sombra bestial (vergonha de carne e leite), duro véu que um raio ainda por nascer deveria rasgar.

Pensará porventura algum dia, uma dessas incocentes porcalhonas, em se arrastar descalça através dos séculos para perdão deste crime: ter-nos engendrado?"

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