Ensaio sobre a série Uma Advogada Extraordinária
Meu ensaio é sobre a série Uma
Advogada Extraordinária, exibida pela Netflix que trouxe como protagonista
uma jovem autista formada em direito, apaixonada por leis, kimbap e baleias.
As bases do Direito
coreano são muito similares com o romano, alemão, anglo-saxão e outros
(concepção tradicional do direito), de modo que não raro se percebe nas
situações apresentadas durante os episódios, soluções parecidas aos nossos
casos concretos.
Dois
motivos justificam a milha escolha acerca dessa série: primeiro, por ser uma
produção coreana onde a profissional busca sempre a justiça, embasada no
direito natural, em contraposição à doutrina do direito positivo; segundo, em
razão do drama de uma família atípica composta por pai solo e filha com autismo
se constituir em um modelo de resistência ao caráter individualista e burguês
do direito.
Contratada por um dos escritórios
mais conceituados da Coreia, Woo Young Woo, demonstra ter
memória fotográfica de todas as leis, e isso acaba sendo uma grande vantagem
para a banca em que atua, entretanto, a advogada tem dificuldades em
desempenhar atividades rotineiras como por exemplo conseguir entrar numa porta giratória
ou entender um diálogo onde o interlocutor use figuras de linguagens.
Um
dos episódios foi sobre um caso que envolvia a divisão de opinião da população de uma
aldeia a respeito da construção
de uma estrada que passaria por dentro da localidade. A empresa que venceu a
licitação teria que derrubar uma árvore gigante de mais de 500 anos de
existência.
Tanto o escritório em que Woo trabalhava, contratado por
uma liderança comunitária que gostaria de manter a tranquilidade e o meio
ambiente preservado, como o escritório da empresa, que litigava para dar
prosseguimento no projeto de construção da estrada foram visitar a aldeia para
tentar obter apoio dos moradores indecisos.
Woo,
compreendendo a dinâmica da criação do direito, propõe resgatar a história da
aldeia, a tradição, a religiosidade através de uma reunião na casa de uma das
lideranças, e dessa forma procura defender o grupo que se sentia oprimido,
desenvolve discurso e prática contra-hegemônica, propõe pontos de vista não
ocidentais e organiza diálogo, formando uma rede que luta por outras
perspectivas de direitos humanos (FONSECA e ROCHA, 2023).
Mesmo
possuindo uma equipe bem maior, mais estruturada para conversar e convencer
cada um habitante da aldeia, o outro escritório teve dificuldades para acessar
os moradores mais antigos por diversos motivos.
A revisão do governo iniciada
para designar a árvore como um monumento natural interrompe os planos de
construção da estrada, pois, Woo consegue provar que o Estudo de Impacto Ambiental ou
Relatório de Impacto Ambiental havia sido feito quando a árvore estava menor, portanto,
o prazo de validade do documento já estava vencido.
Pertinente
fazer uma alusão às “dimensões de
direitos” e refletir sobre aspectos pouco explorados pela literatura jurídica,
como as construções históricas comunitárias, a exemplo do Bem Viver, Pachamama
e Ubuntu, que indicam caminhos para uma ressignificação emancipatória dos
direitos humanos (FONSECA e ROCHA, 2023).
Proteger
os direitos humanos dos moradores daquela aldeia à luz de uma perspectiva
crítica seria preservar o patrimônio ambiental. Situada no topo de uma pequena
colina, a chamada “árvore guardiã” simbolizava o valor da vila no drama coreano.
Os
valores da modernidade, a despeito de assumirem um formato universalizante
foram gerados no seio de uma cultura (ROCHA
e BARBOSA, 2023), portanto, um dos principais obstáculos a ser superado nos processos
de concretização dos direitos humanos é mudar a cultura através de ações
coletivas e enfrentamentos contínuos o que demanda sensibilização e mobilização.
No
episódio relatado acima, os valores da modernidade que seriam a estrada, o
progresso ou a geração de empregos e renda, a princípio, assumiram um formato
universal, como se fossem valores desejados por toda a comunidade, todavia,
bastou uma liderança refletir um pouco mais sobre as consequências daquela
intervenção local para que ela pudesse opor resistência ao que aparentemente já
estava consolidado.
O
referencial comunitário que serviu de base para práticas solidárias e
emancipatórias no campo dos direitos humanos foi o diálogo intercultural e
intergeracional que Woo (com a franqueza de quem possui autismo) conseguiu
estabelecer entre os moradores.
REFERÊNCIAS:
FONSECA, G. F. e ROCHA, J. C. S. R. Direitos
humanos I Salvador: UFBA, Faculdade de Direito; Superintendência de
Educação a Distância, 2023. 103 p. il.
ROCHA, J. C. S. R. e Barbosa A. S. Introdução ao Direito, Salvador: UFBA, Faculdade de Direito; Superintendência de Educação a Distância, 2023. 51 p.
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