Pelo Skype, Nancy Andrighi recebe mais advogados

Às terças-feiras (e às
vezes em outros dias também), a ministra senta à mesa de reuniões de seu
gabinete com uma pilha de petições e memoriais à mão. Esses são os
documentos dos processos que ela vai discutir com os advogados — cerca
de 15 por dia — nas audiências virtuais. À sua frente, um notebook, pelo
qual ela, na hora marcada, vê o advogado e se deixa filmar, dando
início às conversas.
Durante todas as audiências acompanhadas
pela ConJur, no dia 3 de dezembro, Nancy Andrighi agiu com desembaraço
perante a câmera, discutindo o processo como se o advogado estivesse
sentado à mesa. Assessores eram acionados para fazer ajustes no
computador ou trazer documentos
necessários, mas a ministra parecia ter o processo na ponta da língua.
Na capa de cada pasta de processo, fica grampeada uma folha em que ela
faz suas anotações sobre o caso.
A facilidade da ministra para
lidar com a tecnologia é elogiada pelos advogados que podem despachar
com ela sem sair de casa — do Rio Grande do Sul, de Mato Grosso, do Rio
de Janeiro, de São Paulo, e até de Brasília alguns que estariam mais
tarde no tribunal para a sessão de julgamentos.
As
regras da etiqueta seguidas no gabinete, porém, não se refletem em
todas as conferências virtuais. Enquanto alguns advogados se
apresentavam à ministra de terno e gravata, tendo ao fundo obras de arte
do escritório em que trabalham, ou uma parede branca, outros, no
conforto do lar, apareciam como quem acaba de sair da cama, com a camisa
polo desabotoada, os pelos do peito à mostra, em um cenário com direito
a brinquedos de criança espalhados
pelo chão.
As mudanças de cenário e de indumentária, porém,
não pareciam tirar a concentração da ministra, que discutia com afinco
as peças. No dia 3 de dezembro, foi possível observar discussões
interessantes. Em um caso, a ministra concordava com o argumento do
advogado, mas ele não havia prequestionado o dispositivo legal que
discutia na petição ao STJ. Depois de ouvir o operador do Direito, Nancy
disse que iria “fazer um esforço hercúleo” para aceitar o recurso, pois
a decisão questionada ia contra a jurisprudência do STJ.
Em
outro caso, o mais interessante do dia, o advogado insistia que a
ministra aceitasse os chamados terceiros embargos — Embargos de
Declaração nos Embargos de Declaração nos Embargos de Declaração do
Recurso Especial — de um caso onde seguradora e agente financeiro
discutiam a quem caberia pagar as indenizações devidas a pessoas que
perderam seus apartamentos num prédio que
desabou em Recife, logo após sua inauguração.
Ao ouvir do
representante da seguradora que o processo era complicado e que merecia
discussão, Nancy Andrighi foi direta: “Será mesmo que merece, doutor?!”,
questionou. Para o advogado, uma decisão favorável ao pagamento
imediato da indenização aos moradores, abriria as porteiras para uma
“indústria do dano moral”. Para a ministra, porém, não caberia falar
nisso. “Doutor, se há uma indústria, é a de construir apartamentos com
defeito, que deixaram essas pessoas sem casa há 15 anos. Se não querem
que isso crie jurisprudência, paguem o que devem a essas pessoas e
depois, se quiserem, vá reclamar com o agente financeiro que financiou o
empreendimento”, sugeriu, com firmeza. “O que não é admissível é deixar
essas pessoas nesse sofrimento por tanto tempo, elas que não têm nada a
ver da briga da seguradora com a financeira”. O advogado sentiu o
choque e prometeu
levar o ponto de vista da ministra a seu cliente.
Para estar a
par dos processos que vai discutir com os advogados nas sessões de
terça-feira, a ministra usa as noites de segunda-feira para ler os
processos e memoriais que serão levados para a audiência. “As noites de
segunda-feira são sagradas para leitura, e as manhãs de terça, para
atendimento”, define.
Com
isso, diz Nancy Andrighi, ela passou a ganhar tempo para julgar os
processos em seu gabinete. A explicação, diz ela, é que pelo Skype não
tem cafezinho nem conversa fiada. Por isso, é possível receber mais
advogados em menos tempo. Conhecida por ser direta, a ministra foi, em
2012, quem mais julgou no STJ, tendo recebido 9.043 processos e julgado
19.946, segundo os dados do Anuário da Justiça Brasil 2013.
A
ministra foi a primeira a adotar as audiências via Skype, depois de uma
tentativa de receber os advogados em audiências abertas. A iniciativa
das audiências coletivas não foi bem recebida, pois os advogados
reclamavam de levar “broncas” da ministra na frente de colegas. Já as
reuniões virtuais parecem estar rendendo bons frutos, sendo alvo de
elogios entre todos os que aparecem na tela do computador da ministra e a
recebem, da mesma maneira, em casa ou no escritório, nas telas de seus
computadores.
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